quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Bolo de Mel da Madeira


A receita que apresento reporta-se a uma recolha de doçaria conventual do Século XVIII. No entanto, sabe-se que o bolo de mel madeirense tem, em várias paragens da Região, modos de confecção diversificados, mas todos eles saborosos, ricos e que se mantêm ao longo do ano, sempre prontos para adoçar em ocasiões especiais, partido à mão, devidamente acompanhado de um cálice de Vinho Madeira. Este é um dos produtos mais divulgados pela Confraria Gastronómica da Madeira nas dezenas de mostras de gastronomia na qual participa por toda a Europa.

Ingredientes:

2 kg de farinha
16 dl de mel de cana
500 g de manteiga
500 g de banha
1 kg de açucar
500 g de amêndoa
1 1/2 pacote de soda
1 noz moscada ralada
15 g de cravo maranhão
15 g de cravo da Índia
1/2 kg de nozes
1 kg de pão em massa
100 g de passas
50 g de erva doce
70 g de canela
500 g de cidra
raspa de duas laranjas e sumo de uma

Amornar o açucar, a banha e a manteiga. Desfazer e juntar o pão em massa aos poucos. Deitar a farinha, as frutas, soda, canela e demais especiarias até unir. Adicionar o mel em fio e por fim o sumo de laranja. Descansar um dia num alguidar de barro ou madeira e depois cozer no forno, em formas redondas e baixas, sem esquecer de guarnecer com as amendoas e as nozes (em metades).

Carne da Noite

Trata-se de uma receita tradicional do concelho de Santana, própria da Festa e que coincide com a matança do porco. No Funchal, o restaurante "A Casa do Vizinho" apresenta como prato habitual, muito apreciado, não apenas pelos clientes residentes, mas também pelos muitos turistas que por lá passam.

Ingredientes:

1 kg de carne de porco
2 dl vinho da terra (seco)
1 ramos de segurelha
1 folha de louro
2 pimentas da terra
1 abóbora verde
2 c. sopa de banha
sal q.b.

Corte a carne em pedaços e tempere com vinho, segurelha, alho, pimenta, louro e sal. Deixe tomar o sabor dos temperos por 30 minutos. Passado este tempo leve um tacho ao lume, com a banha e quando estiver bem quente, junte os pedaços de carne com os temperos, excepto o vinho. Depois de bem corada, refresque com o vinho e baixe o lume. Tape e deixe cozinhar em lume brando, por uma hora. Passado esse tempo, sirva a carne guarnecida com a abóbora cozida em água temperada de sal.
Bom apetite.

In Sabores - receitas tradicionais madeirenses

domingo, 25 de novembro de 2007

Dourada grelhada

No espaço de pouco mais de uma década, a Madeira afirmou-se como uma região produtora de dourada, sendo que nos próximos meses pode atingir as 700 toneladas e com escoamento garantido. A sua produção através da empresa Ilhapeixe entrou já em velocidade de cruzeiro. à mesa dos madeirenses é um peixe habitual, sobretudo grelhado e aqui fica uma sugestão para o confeccionar.

Ingredientes

4 douradas
azeite
sumo de limão
sal q.b.
400 g de semilha nova
2 tomates maduros
6 folhas de alface
1 cebola

Depois de limpo, faça algumas incisões e tempere as douradas com sal. Antes de as colocar a grelhar, pincele-as com zeite ao qual acrescentou algumas gotas de limão. Numa grelha bem quente coloque-as durante alguns minutos, virando-as com algum cuidado com uma espátula, sem as desmanchar.
Lave as semilhas com casca e coza-as em água e sal. À parte prepare uma salada de alface, tomate, cebola e se desejar um pimento assado, cortado às tiras que deve ser colocado na brasa ou na grelha antes do peixe.
Para guarnecer no momento de servir, prepare um molho simples e aromático. Bata azeite com duas colheres de mostarda, sal, umas gotas de limão e salsa picada. Ligue bem estes ingredientes e sirva numa molheira.
Bom apetite.

Mais restaurantes com gastronomia tradicional


A segunda sondagem realizada neste blog, revela que 90 por cento das respostas revelam que os madeirenses gostariam de ter à disposição nos restaurantes mais receituário tradicional. À questão colocada se gostariam de ver mais receituário tradicional madeirense nos nossos restaurantes, apenas 10 por cento responderam negativamente, o que reflecte uma necessidade que promover e divulgar a gastronomia madeirense que não se esgota na espetada, no atum e no milho frito.
Desde já fica a minha promessa de tudo fazer para sensibilizar os nossos empresários do sector de restauração a integrar nos seus cardápios a nossa rica gastronomia, ainda que, reconheça a dificuldade de serem confeccionadas algumas das receitas tradicionais.
Nem todos os empresários afinam pelo mesmo diapasão. Felizmente, alguns insistem, com sucesso diga-se, na confecção de receitas tradicionais. O Restaurante "Casa do Vizinho", na Rua Imperatriz D. Amélia, propriedade do Sr. Aveiro, é um caso que deve merecer a nossa referência. Não posso deixar de destacar os restaurantes "O Cantinho da Serra", em Santana, o Fuso, na Cancela, o Hotel Jardim Atlântico, nos Prazeres, e da Pousada dos Vinháticos, na Serra D' Água, cujo esforço para promover a gastronomia tradiconal merece ser destacado neste espaço.
Já aqui defendi a criação de um roteiro gastronómico e báquico como forma de ilustrar aos nossos visitantes os melhores recantos para uma boa mesa, por isso vou deitar mãos à obra e começar a trabalhar nesse sentido.
Um bem haja a todos os que votaram.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Sopa de Castanhas


O Curral das Freiras organiza anualmente, no início de Novembro, a Festa da Castanha. O evento, da responsabilidade da Casa do Povo local, concentra habitualmente, milhares de visitantes e este ano não foi excepção. O bom tempo foi aliado de uma festividade que já não passa despercebida quer por residentes, quer por forasteiros. A produção está a crescer sustentadamente e acima de tudo está a melhorar a sua qualidade, sendo que em consequência disso, todo o escoamento ficou assegurado.
Entre outras iguarias produzidas com aquele fruto seco (licores, bolos), a Sopa de Castanhas constitui um prato tradicional do concelho de Câmara de Lobos.

Ingredientes:
150 g de feijão maduro
150 g de batata doce
150 g de semilha
300 g de carne de porco salgada
100 g de inhame
1/2 couve
250 g de castanhas

Coloque uma panela ao lume com três litros de água e a carne de porco. Quando ferver, adicione o inhame em pedaços, o feijão maduro e as castanhas. Deixe cozinhar por 20 minutos. Junte então a semilha, a batata doce, e a couve e deixe cozinhar, em lume brando, por mais 35 minutos. Se necessário acrescente água. Por fim, rectifique os temperos e sirva.
Bom apetite!

In "Sabores - Receitas Tradicionais da Madeira"

sábado, 17 de novembro de 2007

Carne Santa


Esta é uma das receitas tradicionais do concelho do Porto Moniz, ainda servida em alguns (poucos) restaurantes da Região. Recentemente foi divulgada pela Confraria Gastronómica da Amadora, no âmbito do Concurso de Gastronomia Regional Portuguesa, no qual a Região Autónoma esteve representada pela Confraria Gastronómica da Madeira. O concurso envolveu 19 restaurantes que irão confeccionar, até ao final deste mês, receituário tradicional de 19 confrarias portuguesas.
A proximidade da Festa (Natal) faz com que muitas pessoas apontem para a necessidade de apresentar novas, mas tradicionais, opções à mesa. Bom apetite!

Ingredientes:

400 g de carne de porco (pá)
400 g de carne de vaca
5 dentes de alho
2 cebolas
3 tomates
2 dl de vinho
2 c.(sopa) de banha
2 pimentas da terra
1 ramo de segurelha
1 folha de louro
1 ramo de manjerona
800 g de semilhas pequenas
sal q.b.

Tempere a carne de porco de véspera com as ervas aromáticas, o vinho, as cebolas, as pimentas e os alhos esmagados. No outro dia, envolva-lhes a carne de vaca e deixe marinar por mais 30 minutos. De seguida, leve um tacho ao lume com a banha. Quando estiver quente adicione as carnes escorridas e deixe corar. Regue então com o líquido da marinada e baixe o lume. Tape o tacho e deixe cozinhar, em lume brando, por uma hora. Durante a cozedura, mexa e se necessário acrescente água. Entretanto descasque as semilhas e coza-as em água temperada de sal. Sirva com a carne.

(in Sabores - Receitas Tradicionais Madeirenses)

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Resultados da sondagem

A primeira sondagem que lançei neste blogue teve um resultado que merece reflexão. À questão colocada se achavam que a gastronomia madeirense estava a ser bem promovida e defendida, 70 por cento responderam que não, enquanto os restantes consideraram o contrário. O trabalho da Confraria Gastronómica da Madeira, única associação cultural que defende, promove e divulga o receituário tradicional da Região, tem de se esforçar mais.
Ora, foi precisamente com o intuito de contribuir para uma melhor divulgação da nossa gastronomia que criei este espaço de promoção de um sector que se arrisca a ser ultrapassado por modas que em nada contribuem para o destino turístico e para a própria economia regional.
Neste mundo cada vez mais globalizado, importa apostar na "glocalização", ou seja, na origem, nos locais, nas regiões, por forma a garantir a genuinidade do seu povo. A criação de confrarias em toda a Europa, está a conseguir inverter a tendência observada nos últimos 30 anos, com o crescimento desenfreado do "fast food".
Indicadores recentes revelam que um em cada quatro restaurantes franceses optou nos últimos cinco anos por retomar o receituário tradicional das regiões onde estão sedeados, adaptando-se às exigências económicas das suas gentes.
Quando os exemplos são bons, devemos segui-los sem rodeios. Um bem haja para os empresários da restauração madeirense que investem no segmento tradicional da gastronomia.

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Apicultura na Madeira

O MEL DE ABELHAS: ALIMENTO RICO PARA A SAÚDE
Quando ouvimos ou pronunciamos a palavra mel, associamos a um insecto conhecido da maior parte de todos nós, que de uma forma ou de outra nos faz lembrar uma experiência passada, muitas vezes negativa – "as picadas ".
Na verdade, não é bem assim, porque apesar de picarem (e só o fazendo em última instância), trata-se de um insecto bastante útil, contribuindo para o aumento do rendimento dos nossos apicultores, pelos produtos que nos proporciona (Alimentícios e medicinais, como o delicioso e rico mel, pólen e Geleia Real; Desinfectantes/cicatrizantes – Própolis; Profilácticos – Veneno da Abelha), e pelo seu importantíssimo papel que desempenha na polinização das plantas, cultivadas e naturais, proporcionando aumentos substanciais na produção e qualidade dos alimentos, bem como no equilíbrio dos diferentes ecossistemas.
Quando nos dói a garganta, ou nos encontramos constipados, com dores ou feridas expostas, lembramo-nos logo de algo que nos faça bem e nos cure. Aí nos lembramos do delicioso e saboroso mel de abelhas. Este líquido precioso, mais conhecido entre nós, produzido pelas abelhas já era utilizado como grande fonte de alimento, nos tempos do aparecimento do Homem sobre a Terra, sendo, portanto, muito provavelmente, o primeiro adoçante que existiu, e hoje, apesar do açúcar de cana, não tem rival para a saúde. "... Frutas e mel constituíram assim a alimentação natural do homem no passado".
Mas afinal o que é o mel e como obtemos " aquele alimento rico, doce e vitamínico", natural, fortificante, acima de tudo isento de aditivos e medicinal. Trata-se de uma substância composta na sua maior parte por açúcares naturais (frutose e glucose) bem como outros componentes importantes ao desenvolvimento humano:
Composição Química Média
(Por 100 gramas de mel)
Água 16,00 gr.
Frutose 40,50 gr
Glucose 34,02 gr
Sacarose 1,90 gr
Sais minerais, Proteinas
Aminoácidos e Outros
Valor Energético 225 Kcal
É um alimento. Obtêm-se essencialmente dos néctares das flores das plantas (árvores de frutos, hortícolas e principalmente das flores selvagens – méis de néctares) e das exudações de certas plantas e organismos vivos (méis de meladas). Estas substância são colhidas, libadas, transformadas e combinadas pelas abelhas, com substâncias específicas (ainda hoje pouco conhecidas pelo homem), para nos darem finalmente o mel. Depois é armazenado nos alvéolos de cera de onde é posteriormente colhido pelo homem.
A qualidade do mel é dada essencialmente pela satisfação de determinados parâmetros, normalizados e estabelecidos por lei ("Norma Portuguesa 1307": Teor em água, acidez, teor em cinzas - minerais, frutose, Glucose, sacarose, HMF, entre outras). No entanto, considerando a sua variabilidade, podem ser definidos segundo o seu aspecto, cor e sabor. Distinguem-se assim méis claros, escuros e de cor média. Muitos méis diferem não só pela sua cor principal, mas em função de outras matrizes diversas. Há por exemplo méis quase incolores, claros e transparentes.
Os méis escuros são considerados por muitos autores como os melhores, mais ricos em sais minerais, mais ácidos e associados a méis multifloras .
A abelha Apis mellífera, predomina nas Ilhas madeirenses - Madeira e Porto Santo, sendo que nesta última (e algumas ilhas do Arquipélago dos Açores), são as únicas que se conhecem, onde não se verifica a existência da praga Varroose, muito prejudicial e que se encontra difundida por todo o mundo. Assim, o mel que aqui se produz encontra-se isento de fármacos destinados ao combate da mesma. A Região, com cerca de 350 apicultores e 3000 colmeias, apresenta produções médias/colmeia de cerca de 9 – 10 litros, verificando-se uma subida destes valores unitários nos últimos tempos, consequência de uma melhoria das técnicas de maneio que vêm sendo implementadas entre os "apicultores" regionais. A sua produção total cifra-se assim entre as 30 – 35 Ton., sendo toda consumida e comercializada entre nós, em estabelecimentos comerciais, para venda directa ao público devidamente embalado e rotulado, pela Cooperativa de apicultores – Apimadeira, bem como locais de consumo na região, na tradicional bebida regional "a poncha", entre outros, sempre em consumo e natureza, dada a sua qualidade.
Em toda a Região, abaixo dos 400 metros, em determinadas zonas (micro-climas), a abelha trabalha durante todo o ano mais ou menos da mesma forma, sendo as recolhas de néctares muito menores, em épocas diferentes, principalmente no período invernal (variando no entanto de local para local). Estas recolhas dependem da abundância da vegetação que é muito variável na mesma época e a altitudes diferentes.
Quero dizer com isto, que não existem picos de produção regulares no tempo, como acontece em algumas Regiões, em que existem grandes extensões de floração (Trevo, Girassol, Rosmaninho, Eucalipto e outros). Isto explica os valores de produção anteriormente referidos.
Os méis predominantes são o multiflora (dada as pequenas ou mesmo inexistentes áreas de vegetação única). Possuem características próprias, mais rico, mais completo para a nossa alimentação que os uniflora. Sendo nosso, deve ser defendido como um produto com características únicas, principalmente o mel de montanha ou da zona da Floresta Laurissilva. Mesmo quando o ano é bom em eucalipto o mel continua a ser multiflora com grande predominância de néctares de eucalipto, em algumas zonas da Madeira
Os valores anteriormente referidos, quando comparados com outros países e/ou Regiões (14 - 15 litros), é baixo. No entanto, se pensarmos no nosso clima e no tipo de vegetação que possuímos, verificamos que este não é assim tão baixo, como já referido.
A Região, com os seus diferentes microclimas e zonas de vegetação específica, possui uma gama variada de diferentes tipos de mel, todos eles multiflora, pois não possuímos monoculturas que ocupem áreas consideráveis para tal, desde os mais claros e transparentes, como seja aqueles em que predominam néctares de cardos ensaião, os mais acastanhados, normalmente de zonas mais altas e Laurissilva até os mais escuros (assemelhando-se a "mel de cana") das zonas baixas onde existam bananais.
A cresta, que consiste em retirar o mel das colmeias é, na Região, efectuada de um modo geral (dependendo dos locais), no final do Verão, no entanto o mel pode retirar-se sempre que exista e quando haja condições para tal.
A primeira operação a efectuar é a desoperculação, seguindo-se a centrifugação, extraindo-se deste modo o mel dos opérculos. A limpeza ou filtragem faz-se naturalmente por decantação, obtendo-se, após cinco ou seis dias um mel límpido e isento de impurezas, pronto a enbalar e consumir.
Por vezes, quando a temperatura e mais baixa, o mel solidifica "gela" ou cristaliza. Este, é um fenómeno natural do mesmo, sendo uma garantia do seu grau de pureza, para os compradores que não a têm. A sua diluição pode, se desejar ser realizada em banho-maria, por forma a que não exceda 50 ºC (a colocação da embalagem ao sol é suficiente, fácil e sem gastos). Se a temperatura utilizada for no entanto excessiva, há destruição das propriedades físicas e alimentares do mel perdendo este muitas das suas qualidades. Assim quando desejamos um mel líquido, por associar-mos qualidade/liquidez, podemos estar a adquirir sem saber um mel de baixa qualidade, menos rico, em que o seu valor alimentar foi destruído por aquecimento escessivo.
O mel é muito higroscópico (absorve água com facilidade), como consequência fermenta e estraga-se. Deve por isso fechar-se bem. Pode ser utilizado para o consumo directo, com o pão, leite, chá. Na conservação da manteiga, para o polimento de tecidos (seda, cetim, lã), na preparação de papeis, em produtos higiénicos, como sabões, cremes, pastas dentífricas.
Por fim é muito utilizado em medicina contra o enfraquecimento geral (anemia, doenças cardíacas, hepáticas e renais), os resfriados, afecções das vias respiratórias entre outras, bem como para a preparação de bebidas (licores, poncha, hidromel entre outras).
Duarte Silva (Eng.)
(Apicultor)

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Mel de cana-de-açucar


A cana-de-açúcar poderá ser considerada como a cultura agrícola mais importante da História da Humanidade, pois provocou o maior fenómeno em termos de mobilidade humana, económica, comercial e ecológica. A sua afirmação como cultura agrícola é milenar e abrange vários quadrantes do planeta. É de todas as plantas domesticadas pelo Homem aquela que acarreta maiores exigências.
A sua exploração intensiva desde o século XV (15) gerou grandes exigências em termos de mão-de-obra.
A cana, tal como afirma Josué de Castro, é autofágica. A realidade histórica dos últimos cinco séculos, em que ela assumiu um estatuto de produção em larga escala, assim o confirma. O que aconteceu na Madeira nos séculos XV (15) e XVI (16).
A partir de meados do século XVI (16) o mel-de-cana teve uma importância primordial na economia açucareira sendo, por vezes, considerado como concorrente do açúcar. Por todo o século o debate esteve entre os madeirenses que pretendiam impedir a saída do mel-de-cana e o senhorio que o não permitia.
Por aqui é bastante evidente a importância sócio-económica do mel-de-cana na Madeira no decurso do século XV (15) e que prossegue até aos dias de hoje.
Ao longo dos últimos quatro séculos, o mel-de-cana tem sido imprescindível na doçaria madeirense, que se celebrizou através do mundialmente conhecido Bolo de mel-de-cana da Madeira.
O mel-de-cana começa a ser produzido em 1938, pela Fábrica do Mel, hoje conhecida por Fábrica de Mel-de-Cana do Ribeiro Sêco, desde então tem seguido a mesma "receita" na produção deste produto, havendo uma melhoria ao nível de maquinaria para uma melhor rentabilidade e qualidade.
A produção do mel-de-cana começa com o apanhar das canas-de-açucar que depois são transportadas para a fábrica (também conhecida por engenho do mel), a partir daqui seguem diversas fases, tais como; introdução das canas nos moinhos (conhecidos por engenhos) para que possa sair o líquido da cana o qual dá pelo nome de guarapa; em seguida é filtrada e cozida; depois é novamente filtrada e novamente cozida por várias horas até atingir o grau estabelecido; de seguida sofre a última filtração dando origem ao que chamamos de xarope, tendo este já a cor do mel só que está num estado muito líquido; a parte final da produção é feita na caldeira de vácuo dando origem ao mel-de-cana.
Em suma o mel-de-cana é um líquido xaroposo obtido pela evaporação em diversas fases do sumo da cana conhecido por guarapa, apresenta um aspecto líquido, viscoso e denso de cor âmbar castanha, com cheiro próprio e sabor doce. Sem corantes, nem conservantes.
E é com este rico produto que actualmente podemos aplicar em diversas situações tais como: no bolo de mel-de-cana da Madeira; no fabrico de diversos bolos; na restauração; no yogurt; adoçando o café e etc., devido ao seu valor nutricional.
Já o melaço (também conhecido por mel-do-tanque) e o caldo de cana (termo este usado no Brasil e também conhecido por melado) são resultantes também da cana-de-açúcar, tendo alguns pormenores que o diferem do mel-de-cana.
No caso do melaço é um sub-produto da fabricação do açúcar, tem um aspecto líquido, de cor escura, do qual não é possível extrair maior quantidade de sacarose cristalizada mediante os métodos de fabrico normalmente utilizados na indústria açucareira. Em relação ao caldo de cana é retirado de formas ou limpo na caldeira e apresenta igual imagem que o melaço.

João Melim
(II Conferência da Cultura Gastronómica da Madeira-05.04.02)

A Matança do Porco na Madeira


A morte do porco representa um ritual herdado dos velhos costumes pagãos nos quais eram sacrificados animais. Não em honra de deuses e para proteger as culturas agrícolas, mas por necessidade de salvaguardar para os meses seguintes, o conduto da família. Na Madeira, normalmente, a morte do porco ocorre nas vésperas da Festa (designação madeirense para o Natal), a partir do dia 8 de Dezembro, dia da Imaculada Conceição.
O ritual reúne vários elementos de uma prole, vizinhos e amigos, cada qual com uma função específica que vai desde a simples condução do animal entre o chiqueiro e a zona onde ocorrerá a morte, até ao corte da carne. Uma parte será para consumo ainda durante as festividades natalícias, mas o maior naco será cortado e salgado para conservação.
Todo o processo começa com a criação do suíno, durante alguns meses, num chiqueiro junto à habitação. As habitações uni-familiares dispersas ajudaram na criação de animais, para a subsistência da prole Hoje, só em algumas zonas rurais é possível criar o porco durante a sua fase de crescimento. O porco alimenta-se de restos de comida diária (braje ou boragem) e de uma mistura de farelo (rolão). Por norma, os vizinhos mais chegados contribuem com parte da alimentação do porco, sendo depois recompensados com uma quota parte da carne.
Quando chega o dia da matança, em Dezembro, o porco pesa cerca de duas centenas de quilos e será transportado entre o chiqueiro e o local da morte, sendo amarrado com uma corda pelo pescoço e por uma das patas dianteiras. Colocam o animal no chão, com a cabeça mais baixa que o resto do corpo, amarram a boca, seguram na cabeça e nas patas, enquanto o marchante (homem que mata o animal) mete a faca no "vão do porco" (artéria que liga ao coração), deixando o sangue jorrar para um alguidar.
Antes que o sangue coagule, deitam sal e benzem com um sinal de cruz, com uma faca, para que ninguém dê " mau olhado". Devidamente temperado com salsa e alho, o sangue é cozido e servido de seguida como dentinho (petisco) acompanhado por vinho seco ou aguardente, enquanto o porco é desamarrado e coberto por giesta ou urze para chamuscar o pêlo de ambos os lados. O recurso ao maçarico facilita hoje a tarefa. Arrefecem com panos molhados, raspam a pele com utensílios laminados e lavam a carcaça.
O porco é pendurado de cabeça para baixo para ser aberto ao meio, preso pelas patas traseiras, junto aos tendões. Com recurso a uma faca afiada e com um corte meticuloso, retiram o intestino e os restantes órgãos, como o coração, os pulmões e o fígado. Parte das carnes cortadas e das miudezas, servem para a refeição do final da tarde. Uma espetada de carne com osso, e carne na panela, são confeccionados para todos os presentes que acompanham com pão caseiro, semilhas cozidas com casca temperadas com oregãos e inhame, sem faltar o vinho da casa.
Enquanto todos confraternizam um dos elementos, o mais experiente no corte, procede à picada (corte e divisão): a febra para a carne de vinho e alhos do Natal, e a restante carne será salgada, incluindo a cabeça, as patas, as orelhas, a língua e o rabo. As tripas servem para os enchidos (bucho) e a banha é derretida para guardar e utilizar nos preparos da cozinha.